sábado, 16 de agosto de 2008

Funk do Bem






Funk do Bem

Entrevista: Mardonio Barros

Por Thatiana Cunha
Foto: Ulisses franceschi
fonte:http://www.ligjornal.com.br/1633/caderno.htm

O estudante de pedagogia da UFF, Mardonio Barros, junto com a sua esposa, Adriana Facina criaram uma série de ações em prol do chamado funk do “bem”. Diferente da maioria das pessoas, eles acham que o funk é uma manifestação cultural e por isso tem que ser tratada como tal, assim como seus artistas. O Movimento chamado “Funk é Cultura” em apenas seis meses conseguiu grandes avanços num cenário repleto de preconceitos. Nessa entrevista, ele fala como tudo começou, dificuldades, receptividade, projetos futuros e muito mais.







LIG: Como começou o movimento “Funk é Cultura”?
MB: A minha esposa, Adriana Facina, é professora de História na UFF e está produzindo uma pesquisa de pós-doutorado sobre o funk. Então, criamos o espaço que é o blog “Observatório da Indústria Cultural” que tem esse caráter de pesquisa, extensão e estudo e uma revista chamada “Contra Cultura”. Por conta disso, do interesse que nós já tínhamos há algum tempo e da nossa experiência de participar de movimentos sociais, nós acabamos nos rendendo ao funk. Quando conhecemos os MCs Leonardo e Tafarel e outros tantos, eles já se organizavam em lugares diferentes e o que nós fizemos foi agregar essas demandas. Todos queriam se organizar, todos enfrentavam os mesmos problemas de desrespeitos contratuais e de usurpação de seus direitos autorais. Produziam músicas, criavam e não recebiam os direitos. Alguém retinha esses direitos. Por eles não conhecerem a legislação, esses MCs acabavam assinando contratos, que na sua maioria, eram lesivos e entregavam praticamente toda e qualquer decisão sobre o seu produto para outra pessoa

LIG: Qual o objetivo do movimento?
MB: Criamos por conta desses problemas que são comuns no mundo do funk nas condições de trabalho tanto para MCs quanto para os DJs, produtores. Além disso, há uma crítica grande desses MCs, não só os antigos, mas alguns novos da ditadura da indústria cultural em relação ao o que é produzido. Hoje a gente tem o predomínio da pornografia e da apologia a violência. Essas pessoas, justamente, são as que se contrapõem a isso e sonham com o funk enquanto cultura e que ocupe um lugar na sociedade sem discriminação como o samba que em outros momentos passou pelo mesmo processo discriminatório principalmente se você prestar atenção por quem os produz. O samba teve sua origem nas favelas e morros com os negros. Então a gente tem forte essa marca do preconceito racial e social. Esses são alguns dos problemas. E a gente identificou que o funk não era nem um movimento racial nem social. Era criminalizado. É a única manifestação cultural que para você fazer alguma atividade quem autoriza é a secretaria de segurança pública e não a de cultura. O funk não é tratado no ministério de cultura. O debate era exatamente esse. Como você cria leis, organizações que lutem pelos direitos desses trabalhadores.

LIG: Quando e onde vocês costumam se encontrar?
MB: Essas reuniões, chamadas “Rodas de Funk”, acontecem em diferentes lugares. Geralmente nas casas dos MCs ou na casa de quem está começando a fazer essa discussão com eles. Esses encontros são importantes para os MCs conversarem sobre a vida, os problemas e para cantarem também. O último que aconteceu foi na minha casa e acabou criando uma série de problemas com a síndica do condomínio. Fui procurar saber os motivos uma vez que as músicas não faziam nenhum tipo de apologia e não tínhamos excedido o horário nem tampouco o volume. E para minha surpresa, ela respondeu que não queria aqueles encontros lá porque era funk e que os moradores da favela próxima ao condomínio podiam querer freqüentar também. Os próximos encontros vão acontecer no dia 17, com um churrasco na casa do MC Julinho Santa Cruz e no dia 24 vamos estar no Circo Voador.

LIG: Que mensagem os MCs adeptos ao movimento passam?
MB: Hoje a gente sabe que a violência é um dos problemas centrais da nossa sociedade. E qual a discussão desses MCs e a nossa também. O funk não pode estar servindo a morte e nem tão pouco a opressão contra a mulher, ao machismo ou a pornografia. Hoje, esses MCs acreditam que têm o mesmo papel que tiveram no passado se a gente pensar na história do funk quando tinham os bailes de corredor e quem acabava com as brigas eram os MCs, cantando e pedindo a paz. É esse o canto que eles querem que predominem. Quem quiser produzir outras coisas vão continuar produzindo.

LIG: Como é a recepção de vocês nas comunidades dominadas pelo tráfico onde os bailes funks, em sua maioria, pregam a violência e o sexo?
MB: Não têm problemas. Alguns MCs sempre cantaram esse tipo de funk e moram nas favelas. Os MCs Junior & Leonardo, por exemplo, fizeram uma música chamada “Pra sempre favela” que fala justamente sobre tudo que o movimento defende. E os traficantes nos bailes acabam ouvindo. Não há censura do tráfico. Da milícia sim. A milícia é mais ideológica em relação a isso. Por isso, não vamos para comunidades dominadas pelas milícias.

LIG: Você imagina que a luta para acabar com o preconceito vai ser longa?
MB: O movimento já conseguiu muitas conquistas num curto espaço de tempo. E a gente também não tem essa idéia pragmática que tem que ser agora. A luta do funk não é só para hoje, é permanente para que a gente possa melhorar nossa produção cultural e que o funk seja sempre algo positivo que contribua para a formação de uma sociedade melhor.

LIG: E como vocês fazem para divulgar o movimento para as pessoas num modo geral?
MB: A gente fez um manifesto porque se ficar só falando dos problemas não vai ter nada para documentar. Como fazer com que pessoas não olhem o funk como pornografia e apologia ao crime somente, mas que existe uma movimentação de construção de outras possibilidades de funk. O que a gente tem percebido com esse manifesto foi o adesismo de diferentes setores como partidos políticos, movimentos sociais, organizações políticas das mais variadas e pessoas que quando tomaram conhecimento do manifesto entenderam o que a gente tem falado há algum tempo e a partir daí, se abriram para nos apoiar. O manifesto tem servido para abrir caminhos porque é muito mais difícil a pessoa ouvir o funk. As pessoas precisam saber que há muito mais na produção do funk do que alguns setores acabam apontando.

LIG: E vocês já conseguiram alguma mudança na legislação?
MB: A gente está num período muito complicado que é o eleitoral. Muitas pessoas que compraram nossa luta estão envolvidas em campanhas e acaba dificultando a nossa relação. Não quero que o movimento seja usado como algo eleitoral. A nova lei já foi apresentada no plenário, mas ainda não foi votada. O impressionante foi a quantidade de adesão dos deputados estaduais. Essa lei fala das condições de trabalho dos profissionais ligados ao funk, contratos abusivos e usurpação dos direitos autorais.

Contato: orkut “ Movimento Funk é cultura”

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Caros companheiros da sociedade civil niteroiense,

O tom desta carta é, antes de tudo, de alerta. Estou baseado em informações de terceiros sobre a participação de alguns membros desta sociedade no Conselho Municipal de Cultura de Niterói, uma vez que não pude participar dos últimos encontros e, tampouco, da eleição dos membros da câmara a que pertenço, a de radiodifusão, por motivos de trabalho.

Venho alertar esta sociedade sobre as atitudes e os discursos praticados pelas diferentes câmaras setoriais deste Conselho, que por vezes ferem o princípio do que penso ser a legitimidade do principal objetivo deste Conselho – participação da sociedade civil no encaminhamento de propostas ao Governo no que tange à cultura da cidade de Niterói. Em um espaço mínimo de tempo, fui também atingido por uma bomba que sugeriu, logo de cara, um separatismo explícito entre alguns membros da câmara setorial de radiodifusão. Aqueles que participaram da eleição dos conselheiros devem saber do que estou falando: uma enxurrada de radicalismo, procedida de isolamento de alguns setores importantes para encaminharmos e concretizarmos as nossas propostas.

O Conselho Municipal de Cultura sugere uma forma participativa da sociedade civil niteroiense na política pública do nosso município, ou seja, um modelo cooperativo. Não podemos partir do zero com princípios separatistas, correndo o risco de afastarmos nossa ligação que ainda nem começou de fato com a política local. Antes de ser um modelo partidário, a política é formada por pessoas que encaminham propostas, estas a serem estudadas e, possivelmente, aprovadas. Ressalvo também a importância dos conselheiros das câmaras que, por serem representantes das propostas dos demais membros, são obrigados a saber escutar quando necessário às propostas alheias, e não querer simplesmente impor sua máxima vontade contradizendo o próprio princípio da representatividade que requer o cargo eletivo de conselheiro. Esse modelo ultrapassado de representar somente uma minoria dominante é, de fato, o que mais vemos nesse nosso sistema falho. Não podemos repetir os mesmos erros.

Acredito fielmente nesse modelo cooperativista de diálogo, que pode nos trazer benefícios enquanto pessoas que participam de formulações das políticas públicas da nossa cidade. Resta-nos, por enquanto, irmos pensando e redigindo as nossas propostas enquanto aguardamos a nossa vez de apresentá-las, como legítimos cidadãos niteroienses. Só então seremos capazes de julgar o tratamento que receberemos frente às autoridades públicas e juntarmos nossas forças para fazer valer os nossos princípios enquanto cidadãos. Simplificando: antes de cairmos na porrada com os políticos, temos que ao menos tentar dialogar com eles. Só assim conseguiremos legitimar e fazerem encarar com seriedade a existência desse Conselho Municipal de Cultura. Somos nesse Conselho, acima de tudo, formado por cidadãos que querem efetivamente participar das políticas públicas da nossa cidade.

Atenciosamente,

BERNARDO CAHUÊ MARTINS
Câmara de Radiodifusão do CMC