Kluk Neto disse:
Caro Ronaldo,
Muito direto e lúcido o seu texto. Infelizmente aqueles que apoiam o Procultura não estõa nem aí para a racionalidade econômica, as análises técnicas mais profundas ou o equilíbrio que a estrutura da atual Lei Rouanet dispõe entre financiamento Direto (FNC)compartilhamento da decisão de alocação (Renuncia Fiscal via Mecenato) e os Ficart.
É difícil se não impossível para alguns perceber que a Lei Rounet não foi mal concebida, mas mal gerenciada.
Compram o discurso do MinC que, para esconder a sua própria incompetência administrativa em resolver as distorções que ele mesmo permite que haja, resolveu à moda de Chavez, Ahmadinejad, Fidel e outros nossos compatriotas, eleger um grande Satã.
Esse grante Satã é São Paulo, o Rio, o Sudeste, seus produtores culturais, suas instituiçõe de cultura que aprenderam a utilizar o Mecenato e suas empresas, sua população, que é preciso lembrar, sustentam firmemente o Brasil já que são concentradas também como o Mecenato da Rouanet o é.
A estratégia da desunião é deletéria. Torço em vão para que o meio artístico brasileiro possa encontrar um caminho de entendimento para a convivência harmônica de diversos mecanismos de incentivo à cultura.
O Brasil é grande e poderíamos desejar que nele convivessem simultanemente diversos mecanismos de financiamenrto à Cultura que surgiram e se desenvolveram ao longo da nossa história.
É possível e desejável que convivam mecanismos mais antigos como o financiamento das Confederações de Comercio e Indústria (SESC SESI), com mecanismos jovens como o Mecenato, o FNC e os Ficarts da Lei Rouanet.É possível ainda que esses mecanismos convivam com os Pontos de Cultura que tem um longo caminho a percorrer até se aperfeiçoar e produzir efetivamente resultados. E convivam com o inovador sistema de gestão da Cultura das Organizações Sociais implantados pelo Governo de São Paulo.
A cultura e os artistas precisam de todos eles e ainda de mais.
Não precisamos que sejam mutilados os mecanismos atuais para que outros se desenvolvam. A Cultura quer mais e não de menos.
Pode-se diversificar as fontes de recursos ao invés de exaurí-las. Pode-se ampliar os focos de decisão, o que é democrático, ao invés de concentrá-las apenas no organismo estatal.
Mas os artistas e os tantos outros que defendem o Procultura não ouvem isso, não entendem ou não querem entender, pois vivem num mundo ideologizado,estatista, onde o capital e a sua lógica são condenáveis. Onde a arte eleita pelo mercado não é arte e a arte abandonada pelo mercado é arte.
Eles acreditam que já que é dinheiro de imposto, então que só o Estado decida.
O Minc rema na direção contrária de tudo o que dá certo na cultura, inclusive no seu próprio governo.
Num arroubo de busca pelo poder e no seu intento concentrador, já que não se conforma como o Mecenato tem amis dinheiro que o próprio MInC, deixa de perceber que todo o movimento que tem dado certo no campo cultural vai na direção de deixar a liberdade ser exercida, não só no campo da produção como no da gestão da cultura e da arte.
Vejamos.
Qual a similaridade entre os mecanismos de financiamento à Cultura. Lei Rouanet, SESC, OSs de Cultura e programa Cultura Viva.
Todos eles apota na direção de afastar do Estado do papel de gestor direto da produção cultural. Todos vão na direão de compartilhar com a sociedade civil a gestão dos recursos.
Independente do mecanismo, é preciso reconhecer que no fundo quem paga a conta sempre é o setor privado.O Estado é apenas um arrecadador de riquezas através do imposto e deve encontrar a melhor maneira de fazer a riqueza fluir de volta à sociedade.Não as produz. O dinheiro do imposto que alimenta os recuros federais da Rouanet, do ProAC de São Paulo ou a contribuição das empresas sobre a folha de pagamento que alimenta o fluxo do Sesc é produzido sempre na iniciativa privada, pelo trabalho e suor dos trabalhadores, pelo capital posto a serviço da produção, enfim por todos nós da sociedade civial que não somos o Estado.
Portanto cabe ao Estado encontrar as melhores formas e os canais pelos quais essa riqueza deve retornar à sociedade que as produz.
Esse Ministério passou oito anos fazendo força para entupir as artérias pelas quais circulam os recursos para a cultura na esfera federal, sem conseguir construir novos dutos consistentes que alimentem as áreas não irrigadas.Para isso basta ver como o Fundo Nacional da Cultura gerenciado pelo Minc também é concentrado na região Sudeste.
Agora querem colocar o torniquete e apertar até gangrenar com a promessa de que assim será melhor para todos. Quem aqui é bobo ? Ninguém é bobo, mas parece que todo mundo tem medo de lobo mal. Se ficarmos com medo aí ele engole mesmo. Tá na hora de chapeuzinho botar a boca no trombone. E botar os pingos nos is.
fonte:
sábado, 27 de março de 2010
“Estressante, mal formulada, inoportuna e abjeta”
Este artigo deveria ser o primeiro da série. Neste, apontarei as falhas conceituais e contradições que embasam o PL – Procultura.
1) O Minc justifica a supressão da Lei Rouanet “devido às distorções produzidas pelo seu exercício nos seus 18 anos de existência”.
Comentários:
Uma lei não gera distorções, gera conseqüências. Da mesma forma que esse PL transformado em lei, portanto, uma afirmação equivocada. A Lei Rouanet possui três mecanismos: Mecenato, Fundo Nacional de Cultura e Ficarte.
O ataque do Minc à Lei Rouanet localiza-se no exercício do Mecenato, que foi e é incentivado pelo próprio Minc por meio de uma renúncia fiscal. Pelo Mecenato, as empresas e pessoas físicas aplicam seus impostos a pagar em projetos ou programas previamente autorizados pelo Minc, através da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, cujo presidente é o Senhor Ministro. Portanto, se há a aludida distorção, ocorre com a autorização e o incentivo do Minc.
Qualquer distorção pode ser corrigida hoje, por meio do Fundo Nacional de Cultura, portanto, dispensável o Procultura.
O Minc ampliou a renúncia fiscal (mecenato) de R$ 400 milhões para R$ 1,2 bilhão, e agora quer destruir o que construiu. Não dá para entender!
2) Há uma mensagem sureptícia na campanha para aprovar o PL: “A nova lei atenderá a todos”.
Comentários:
■Se fosse verdadeira, seria boa, mas não é. O Minc deveria informar quanto depositará nos fundos para atender a todos.
■Por exemplo, o Minc afirma que somente 20% dos programas aprovados são beneficiados pela renúncia – R$ 1,2 bilhão em 2009 – portanto, para atender a todos (80%), deveria depositar no FNC mais R$ 6 bilhões. Fará isto?
■Eu não li ainda qual será o compromisso de recursos que o governo aportará para acabar com as distorções. Ouço somente a catilinária: “Morte à Rouanet, que serve ao Sudeste e, em particular, os produtores e instituições paulistas”, como se São Paulo não fosse parte do Brasil.
3) “A Consulta pública amadurece a proposta”.
Comentários:
Foram sete anos de consulta para parir um PL que deforma o sistema de financiamento público da cultura.
As consultas do Minc sempre foram dirigidas a dar “pau” na lei Rouanet do começo ao fim dos encontros, palestras, seminários e entrevistas. Nenhuma qualidade, só apontam defeitos. Por que demoraram sete anos para desmontá-la? E por que ampliaram os seus recursos?
4) Na verdade, a supressão da Rouanet esconde a vontade política de apequenar a produção das entidades e dos produtores independentes. É uma proposta que asfixia o mecenato, pois o PL concede de 40 a 80% da renúncia, conforme critérios a serem estabelecidos em decreto. Sobrará às empresas, aplicar:
a) Na lei do audiovisual, oferecendo 125 % de retorno
b) Na lei do esporte, 100%
c) Os novos Fundos, 100%
d) No Ficart, 100% até 2014
Pergunto:
Qual a empresa ou a pessoa física que aplicará em projetos e programas, com retorno fiscal entre 40 e 80% e restrito a 0,5% da renúncia? Ou seja, a partir da aprovação desse PL, nenhum proponente poderá captar mais do que 0,5% do valor da renúncia. Assim, o proponente poderá, no máximo, angariar R$ 6 milhões, enquanto que o patrocinador descontará entre R$ 2,4 a R$ 4,2 milhões de seu imposto a pagar. “Sobrarão” museus, institutos, programas e projetos da sociedade civil.
Os produtores, segundo a mesma propaganda, poderão vender seus projetos aos “gestores” do Ficarte. Quantos sobreviverão? Poucos, com certeza.
A proposta do PL é estressante, mal formulada, inoportuna e abjeta.
Estressante – porque acirra ao limite a resistência dos produtores e das entidades culturais independentes.
■Mal formulada:
a) não explica como acabará com as alegadas “distorções” da Rouanet, poderiam resolvê-las já, alocando mais recursos do FNC da Rouanet,
b) mata o atual Mecenato e desloca acintosamente o poder para as mãos dos futuros “donos” do Ficart e do próprio governo.
■Inoportuna:
a) o governo está propondo uma mudança de hábito adquirido há 18 anos, que resultará em deslocamento de investimento para outras áreas como esporte e cinema,
b) o mercado quer garantia jurídica a longo prazo, e o PL quebra a confiança dos patrocinadores, pois torna o marco legal instável.
■Abjeta porque: era hora de unir, somar e multiplicar. O Minc propõe desunir, diminuir e dividir. Joga o Brasil contra o Sudeste e não faz conta de que somos 66% da população. Se hoje essa região detém 80% do mecenato, a distorção é de 14%. Em valor: R$ 240 milhões. Portanto, passível de correção imediata pelo FNC.
Cabe ao Congresso barrar esse PL ou o Minc revisá-lo.
. Sobre "Ronaldo Bianchi " http://www.ronaldobianchi.com
Administrador Público pela FGV, MBA pela FIA-USP e Mestrado pela PUC, atualmente é Secretário Adjunto do Estado da Cultura.
fonte: http://www.culturaemercado.com.br/ideias/estressante-mal-formulada-inoportuna-e-abjeta/
1) O Minc justifica a supressão da Lei Rouanet “devido às distorções produzidas pelo seu exercício nos seus 18 anos de existência”.
Comentários:
Uma lei não gera distorções, gera conseqüências. Da mesma forma que esse PL transformado em lei, portanto, uma afirmação equivocada. A Lei Rouanet possui três mecanismos: Mecenato, Fundo Nacional de Cultura e Ficarte.
O ataque do Minc à Lei Rouanet localiza-se no exercício do Mecenato, que foi e é incentivado pelo próprio Minc por meio de uma renúncia fiscal. Pelo Mecenato, as empresas e pessoas físicas aplicam seus impostos a pagar em projetos ou programas previamente autorizados pelo Minc, através da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, cujo presidente é o Senhor Ministro. Portanto, se há a aludida distorção, ocorre com a autorização e o incentivo do Minc.
Qualquer distorção pode ser corrigida hoje, por meio do Fundo Nacional de Cultura, portanto, dispensável o Procultura.
O Minc ampliou a renúncia fiscal (mecenato) de R$ 400 milhões para R$ 1,2 bilhão, e agora quer destruir o que construiu. Não dá para entender!
2) Há uma mensagem sureptícia na campanha para aprovar o PL: “A nova lei atenderá a todos”.
Comentários:
■Se fosse verdadeira, seria boa, mas não é. O Minc deveria informar quanto depositará nos fundos para atender a todos.
■Por exemplo, o Minc afirma que somente 20% dos programas aprovados são beneficiados pela renúncia – R$ 1,2 bilhão em 2009 – portanto, para atender a todos (80%), deveria depositar no FNC mais R$ 6 bilhões. Fará isto?
■Eu não li ainda qual será o compromisso de recursos que o governo aportará para acabar com as distorções. Ouço somente a catilinária: “Morte à Rouanet, que serve ao Sudeste e, em particular, os produtores e instituições paulistas”, como se São Paulo não fosse parte do Brasil.
3) “A Consulta pública amadurece a proposta”.
Comentários:
Foram sete anos de consulta para parir um PL que deforma o sistema de financiamento público da cultura.
As consultas do Minc sempre foram dirigidas a dar “pau” na lei Rouanet do começo ao fim dos encontros, palestras, seminários e entrevistas. Nenhuma qualidade, só apontam defeitos. Por que demoraram sete anos para desmontá-la? E por que ampliaram os seus recursos?
4) Na verdade, a supressão da Rouanet esconde a vontade política de apequenar a produção das entidades e dos produtores independentes. É uma proposta que asfixia o mecenato, pois o PL concede de 40 a 80% da renúncia, conforme critérios a serem estabelecidos em decreto. Sobrará às empresas, aplicar:
a) Na lei do audiovisual, oferecendo 125 % de retorno
b) Na lei do esporte, 100%
c) Os novos Fundos, 100%
d) No Ficart, 100% até 2014
Pergunto:
Qual a empresa ou a pessoa física que aplicará em projetos e programas, com retorno fiscal entre 40 e 80% e restrito a 0,5% da renúncia? Ou seja, a partir da aprovação desse PL, nenhum proponente poderá captar mais do que 0,5% do valor da renúncia. Assim, o proponente poderá, no máximo, angariar R$ 6 milhões, enquanto que o patrocinador descontará entre R$ 2,4 a R$ 4,2 milhões de seu imposto a pagar. “Sobrarão” museus, institutos, programas e projetos da sociedade civil.
Os produtores, segundo a mesma propaganda, poderão vender seus projetos aos “gestores” do Ficarte. Quantos sobreviverão? Poucos, com certeza.
A proposta do PL é estressante, mal formulada, inoportuna e abjeta.
Estressante – porque acirra ao limite a resistência dos produtores e das entidades culturais independentes.
■Mal formulada:
a) não explica como acabará com as alegadas “distorções” da Rouanet, poderiam resolvê-las já, alocando mais recursos do FNC da Rouanet,
b) mata o atual Mecenato e desloca acintosamente o poder para as mãos dos futuros “donos” do Ficart e do próprio governo.
■Inoportuna:
a) o governo está propondo uma mudança de hábito adquirido há 18 anos, que resultará em deslocamento de investimento para outras áreas como esporte e cinema,
b) o mercado quer garantia jurídica a longo prazo, e o PL quebra a confiança dos patrocinadores, pois torna o marco legal instável.
■Abjeta porque: era hora de unir, somar e multiplicar. O Minc propõe desunir, diminuir e dividir. Joga o Brasil contra o Sudeste e não faz conta de que somos 66% da população. Se hoje essa região detém 80% do mecenato, a distorção é de 14%. Em valor: R$ 240 milhões. Portanto, passível de correção imediata pelo FNC.
Cabe ao Congresso barrar esse PL ou o Minc revisá-lo.
. Sobre "Ronaldo Bianchi " http://www.ronaldobianchi.com
Administrador Público pela FGV, MBA pela FIA-USP e Mestrado pela PUC, atualmente é Secretário Adjunto do Estado da Cultura.
fonte: http://www.culturaemercado.com.br/ideias/estressante-mal-formulada-inoportuna-e-abjeta/
O Procultura na pele de quem produz cultura
Ronaldo Bianchi 23 março 2010
Este é o segundo artigo sobre o projeto de lei do governo federal para substituir a Lei Rouanet. No primeiro, apontei algumas dificuldades e virtudes. Agora, vou simular situações que os proponentes encontrarão se aprovado o PL. Tomarei como modelo, os estudos de caso quando era estudante de graduação da FGV/SP.
Meus professores enunciavam os casos com nomes fictícios para as empresas, geralmente, problemas ligados a custos, má gestão e oportunidades de mercado. Nesse sentido, para não haver melindre, também usarei nomes fantasia.
CASO 1
As Organizações Sociais do Estado de Emergência poderão angariar recursos federais por meio dessa nova lei?
a) As Organizações Sociais de todos os estados da federação podem, no limite e no conjunto, angariar 10% da renúncia fiscal vigente. Portanto, se a renúncia estiver estipulada em R$ 1 bilhão, a somatória das renúncias para organizações sociais no país não poderá exceder R$ 100 milhões.
b) Cada Organização Social poderá, no máximo, pleitear até 0,5 % da renúncia, ou seja, no exemplo apresentado, R$ 5 milhões.
c) Os seus patrocinadores poderão descontar entre 40 e 80% de sua contribuição, dependendo do que lhes for autorizado pelo Conselho de sua área de expansão.
Seguem alternativas possíveis decorrente desta situação:
a) A Organização Social ficar a zero.
b) Se conseguir autorização, será menor do que R$ 5 milhões.
c) Os patrocinadores poderão descontar entre R$ 2 e 4 milhões de sua contribuição.
CASO 2
O que a organização sem fins lucrativos que realiza a trienal na cidade de Passaperna poderá obter do novo mecenato?
A organização da trienal na cidade de Passaperna poderá pleitear no máximo R$ 5 milhões. Seus patrocinadores poderão abater, no máximo, de 40 a 80% desse valor, ou seja, R$ 2 a 4 milhões. Imagine a situação de certas Bienais.
CASO 3
O Museu do Solavanco poderá contar com a nova lei para seu Plano Anual?
Sim, o Plano Anual do Museu do Solavanco seguirá os mesmos padrões do caso anterior (os mesmos limites se aplicam).
CASO 4
A Organização Tabajara, formada por um conjunto de empresas com fins lucrativos, decidiu e há 10 anos implantou o Instituto Cultural Tabajara. A organização poderá descontar do IR, as contribuições que efetuou ao instituto que leva seu nome?
Sim, a Organização Tabajara poderá descontar, no máximo, 0,5% do total da remissão, se for R$ 1 bilhão, será R$ 5 milhões. Destas, 40% serão passíveis de desconto no IR, ou seja, R$ 2 milhões. Isto se aprovado sem ressalvas pelo Ministério.
Haveria mais dois casos a serem explorados: o pleiteante do Fundo Nacional de Cultura e a formação do Ficart. Este, passível de receber contribuição totalmente dedutível até 2014, quando as contribuições serão reduzidas a 75%.
Deixo de comentá-los por não estarem regulamentadas, seria fruto de imaginação.
Podemos concluir, apontando qual será o novo cenário a partir da aprovação integral desse PL.
A proposta cultural, se transportada a condição ecológica, metaforicamente sairíamos da Mata Atlântica direto para o deserto do Saara, sem passar pelo serrado e pela caatinga.
Quanto ao Ficart, como foi proposto sem qualquer controle do Estado (diferente do Funcine), deverá ser o caminho para a formação de cartéis culturais. Em outras palavras, bancos e financeiras recolherão recursos a custo zero, totalmente dedutíveis, por quatro anos, e aplicarão, a seu critério, em quem lhes interessar e pelo maior retorno.
Em relação ao Fundo Nacional de Cultura, realizará sua obrigação: equilibrar o desbalanceado e proteger o indefeso (coisa que já deveria fazer hoje e não faz).
Continuo acreditando na inteligência dos nossos parlamentares para examinar com cautela, o amanhã cultural. Para mim, se esse PL for aprovado, o cenário será de terra arrasada, onde reinarão:
1) O governo pelo FNC, e
2) Os grupos gestores do Ficart.
As importantes instituições culturais brasileiras, formadas por empresas e pela sociedade civil no bojo de um marco legal estável, serão desmontadas ou reduzidas a atuações pequenas e inexpressivas.
Os produtores pequenos e médios dependerão ainda mais das bancas de aprovação dos Fundos e dos futuros gestores do Ficart.
Triste e inaceitável.
. Sobre "Ronaldo Bianchi " http://www.ronaldobianchi.com
Administrador Público pela FGV, MBA pela FIA-USP e Mestrado pela PUC, atualmente é Secretário Adjunto do Estado da Cultura.
fonte: http://www.culturaemercado.com.br/ideias/o-procultura-na-pele-de-quem-produz-cultura/
Este é o segundo artigo sobre o projeto de lei do governo federal para substituir a Lei Rouanet. No primeiro, apontei algumas dificuldades e virtudes. Agora, vou simular situações que os proponentes encontrarão se aprovado o PL. Tomarei como modelo, os estudos de caso quando era estudante de graduação da FGV/SP.
Meus professores enunciavam os casos com nomes fictícios para as empresas, geralmente, problemas ligados a custos, má gestão e oportunidades de mercado. Nesse sentido, para não haver melindre, também usarei nomes fantasia.
CASO 1
As Organizações Sociais do Estado de Emergência poderão angariar recursos federais por meio dessa nova lei?
a) As Organizações Sociais de todos os estados da federação podem, no limite e no conjunto, angariar 10% da renúncia fiscal vigente. Portanto, se a renúncia estiver estipulada em R$ 1 bilhão, a somatória das renúncias para organizações sociais no país não poderá exceder R$ 100 milhões.
b) Cada Organização Social poderá, no máximo, pleitear até 0,5 % da renúncia, ou seja, no exemplo apresentado, R$ 5 milhões.
c) Os seus patrocinadores poderão descontar entre 40 e 80% de sua contribuição, dependendo do que lhes for autorizado pelo Conselho de sua área de expansão.
Seguem alternativas possíveis decorrente desta situação:
a) A Organização Social ficar a zero.
b) Se conseguir autorização, será menor do que R$ 5 milhões.
c) Os patrocinadores poderão descontar entre R$ 2 e 4 milhões de sua contribuição.
CASO 2
O que a organização sem fins lucrativos que realiza a trienal na cidade de Passaperna poderá obter do novo mecenato?
A organização da trienal na cidade de Passaperna poderá pleitear no máximo R$ 5 milhões. Seus patrocinadores poderão abater, no máximo, de 40 a 80% desse valor, ou seja, R$ 2 a 4 milhões. Imagine a situação de certas Bienais.
CASO 3
O Museu do Solavanco poderá contar com a nova lei para seu Plano Anual?
Sim, o Plano Anual do Museu do Solavanco seguirá os mesmos padrões do caso anterior (os mesmos limites se aplicam).
CASO 4
A Organização Tabajara, formada por um conjunto de empresas com fins lucrativos, decidiu e há 10 anos implantou o Instituto Cultural Tabajara. A organização poderá descontar do IR, as contribuições que efetuou ao instituto que leva seu nome?
Sim, a Organização Tabajara poderá descontar, no máximo, 0,5% do total da remissão, se for R$ 1 bilhão, será R$ 5 milhões. Destas, 40% serão passíveis de desconto no IR, ou seja, R$ 2 milhões. Isto se aprovado sem ressalvas pelo Ministério.
Haveria mais dois casos a serem explorados: o pleiteante do Fundo Nacional de Cultura e a formação do Ficart. Este, passível de receber contribuição totalmente dedutível até 2014, quando as contribuições serão reduzidas a 75%.
Deixo de comentá-los por não estarem regulamentadas, seria fruto de imaginação.
Podemos concluir, apontando qual será o novo cenário a partir da aprovação integral desse PL.
A proposta cultural, se transportada a condição ecológica, metaforicamente sairíamos da Mata Atlântica direto para o deserto do Saara, sem passar pelo serrado e pela caatinga.
Quanto ao Ficart, como foi proposto sem qualquer controle do Estado (diferente do Funcine), deverá ser o caminho para a formação de cartéis culturais. Em outras palavras, bancos e financeiras recolherão recursos a custo zero, totalmente dedutíveis, por quatro anos, e aplicarão, a seu critério, em quem lhes interessar e pelo maior retorno.
Em relação ao Fundo Nacional de Cultura, realizará sua obrigação: equilibrar o desbalanceado e proteger o indefeso (coisa que já deveria fazer hoje e não faz).
Continuo acreditando na inteligência dos nossos parlamentares para examinar com cautela, o amanhã cultural. Para mim, se esse PL for aprovado, o cenário será de terra arrasada, onde reinarão:
1) O governo pelo FNC, e
2) Os grupos gestores do Ficart.
As importantes instituições culturais brasileiras, formadas por empresas e pela sociedade civil no bojo de um marco legal estável, serão desmontadas ou reduzidas a atuações pequenas e inexpressivas.
Os produtores pequenos e médios dependerão ainda mais das bancas de aprovação dos Fundos e dos futuros gestores do Ficart.
Triste e inaceitável.
. Sobre "Ronaldo Bianchi " http://www.ronaldobianchi.com
Administrador Público pela FGV, MBA pela FIA-USP e Mestrado pela PUC, atualmente é Secretário Adjunto do Estado da Cultura.
fonte: http://www.culturaemercado.com.br/ideias/o-procultura-na-pele-de-quem-produz-cultura/
domingo, 14 de março de 2010
O que Gilberto Gil não disse no filme sobre Jards Macalé, o maldito
Por ARNALDO BLOCH
Andei ouvindo de novo “Gil luminoso”, disco só de violão e voz, aquela versão de “Aqui e agora”. Que violão toca o Gil! Aí fui ver o documentário “Jards Macalé — Um morcego na porta principal”, de Marco Abujamra e João Pimentel, em cartaz no Rio. Que violão toca o Jards, “Macao” pros íntimos... Sou fã dos dois, conheço mais a obra de Gil, mas o luxo e a inteligência de Macalé, artista, enter tainer, humorista, cantor, ator, autor, me assombram a cada dia.
Não é uma voz fácil. Como diz Luiz Melodia, é para“ouvidos atentos”. Jards é maldito. Xingou multinacionais, queimou-se um bocado, o boquirroto. Gil, num depoimento gravado quando ministro, comentou, no filme, esse aspecto, de um modo que me entristeceu.
Disse Gil que houve artistas de sua geração, como ele próprio e Caetano, que cuidaram de suas carreiras, construíram cada trabalho com uma certa lógica, em que as roupas, as capas, os conceitos musicais e poéticos, tudo fazia um sentido. (Inclusive, suponha-se, Caetano não ter dado a Jards o crédito pela sonoridade de “Transa”, um golpe duro na sua... carreira.)
Gil diz que, outros, como Macalé, não cuidaram da tal carreira. Abandonaram- na ciclicamente. Disse-o com um certo ar de lamento, sem nada acrescentar do ponto de vista de um julgamento de valor. Depois, respondendo a uma pergunta, admitiu, com franqueza, que transigiu, que cedeu, que fez concessões. E justificou: é lógico!, afinal, a própria existência do “outro”, a admissão de que não estamos sós na dinâmica social, pressupõe concessões, então como é que não se vai fazê-las?, Gil altissonou com uma veemência daquelas que tornam a sentença uma evidência inclemente.
“Faz parte do ethos e do pathos”, acrescentou, e aí eu me lembrei que, em cena anterior do filme, Macalé fala dos patos (sem agá), dizendo que, certa vez, as aves, ao ouvi-lo cantarolar à beira de um lago, responderam aos volteios de seu canto cheio de detalhes, repiques, síncopes, repetindo suas inflexões. Pois, segundo Macalé, é da natureza dos patos ouvir música e responder, e eu acredito: isso ocorre com outros pássaros também, quem já cantou na floresta sabe.
O Gil, ao proferir essas verdades elegantes, não tinha qualquer obrigação de atentar para o fato de que, mesmo tendo abandonado ciclicamente sua carreira, Macao, o conjunto da obra, ainda que difícil, para loucos e raros (ao menos por aqui, pois em Paris ele seria visto como um grande cantor histriônico, de uma expressividade singularíssima) constitui um todo caótico e uno, paradoxal, complexo, culto.
Gil não tem qualquer obrigação, tampouco, de atentar para outro fato: o de que, entre não transigir e não fazer concessão alguma (impossível) e fazer o máximo de concessões possíveis, há gradações. E que a evidência de que Macalé fez poucas concessões constitui a formação da figura que ele é, confere-lhe a sua originalidade, a sua qualidade única. Gil não tinha obrigação de dizer isso nem de prestar qualquer homenagem ao cantar demiúrgico e ao violão pós-Baden Powell posto no liquidificador das emoções e do sofrimento e do amor mais intransigentes, e à sua maneira própria de ser pop sem parecer pop.
Num documentário de Andrucha, Gil, citando Andy Warhol, diz que, se ser pop é gostar das coisas, ele é pop no sentido de “gostar de gostar das coisas”; se Gil, então, gosta tanto de tudo, se abraçou tanto o mundo em seu arcabouço tropico-antropofágico, se Gil elogiou tanto o trabalho de Sandy e exaltou tanto Ivete Sangalo, será que custava muito deixar umas migalhas de reconhecimento ao gênio de Macalé, o pato? Não precisava nem dizer, como disse o Zé Celso Martinez Corrêa no filme de Abujamra e João Pimentel, que Macalé é da estatura artística “de uma Maria Callas ou de um Oscar Niemeyer”. A gente sabe que Zé Celso sempre fala através de hipérboles, embora faça um certo sentido, para quem olha o Macalé como um ser múltiplo, um mascarado de Gotham City, um super-homem mautneriano mas abençoado com mil-e-uma técnicas e arquiteturas, compará-lo a Callas e a Niemeyer sem que isso se converta numa equação de equivalência perfeita, ora pô!
Vejo, talvez equivocadamente, se for me corrijam, a fala de Gil como uma justificativa. Um statement que, mesmo inconscientemente, ilude o receptor, induzindo-o a mergulhar numa hiper-relativização que na verdade não relativiza nada e acaba por desaguar no maniqueísmo. O certo é cuidar da carreira, o certo é embarcar numa lógica contínua, o certo é fazer as concessões que a cada ser forem adequadas, e cada ser colherá os benefícios (de agir assim) enquanto os que não rezarem por essa cartilha, os “outros”, colherão a erva daninha do “maldito”, saco de gatos no qual Macalé, junto com tantos outros, foi jogado. Primeiro para se o excluir do “sistema” e, depois, para trazê-lo de volta, sob um selo que iguala e uniformiza, para efeito de venda, todos aqueles que não “cuidaram” de suas carreiras e, mesmo assim, lá no fundo, bem escondidas atrás das barricadas, têm uma puta expressão artística e são grandiosos e insólitos. Gil, meu ídolo, não tinha obrigação de dizer isso, mas a gente não controla as expectativas sobre nossos ídolos e, por isso, fiquei triste, mas vou lá ouvir de novo o violão luminoso de Gil e, depois, ver de novo o Macalé brilhar no cinema.
Não percam.
Andei ouvindo de novo “Gil luminoso”, disco só de violão e voz, aquela versão de “Aqui e agora”. Que violão toca o Gil! Aí fui ver o documentário “Jards Macalé — Um morcego na porta principal”, de Marco Abujamra e João Pimentel, em cartaz no Rio. Que violão toca o Jards, “Macao” pros íntimos... Sou fã dos dois, conheço mais a obra de Gil, mas o luxo e a inteligência de Macalé, artista, enter tainer, humorista, cantor, ator, autor, me assombram a cada dia.
Não é uma voz fácil. Como diz Luiz Melodia, é para“ouvidos atentos”. Jards é maldito. Xingou multinacionais, queimou-se um bocado, o boquirroto. Gil, num depoimento gravado quando ministro, comentou, no filme, esse aspecto, de um modo que me entristeceu.
Disse Gil que houve artistas de sua geração, como ele próprio e Caetano, que cuidaram de suas carreiras, construíram cada trabalho com uma certa lógica, em que as roupas, as capas, os conceitos musicais e poéticos, tudo fazia um sentido. (Inclusive, suponha-se, Caetano não ter dado a Jards o crédito pela sonoridade de “Transa”, um golpe duro na sua... carreira.)
Gil diz que, outros, como Macalé, não cuidaram da tal carreira. Abandonaram- na ciclicamente. Disse-o com um certo ar de lamento, sem nada acrescentar do ponto de vista de um julgamento de valor. Depois, respondendo a uma pergunta, admitiu, com franqueza, que transigiu, que cedeu, que fez concessões. E justificou: é lógico!, afinal, a própria existência do “outro”, a admissão de que não estamos sós na dinâmica social, pressupõe concessões, então como é que não se vai fazê-las?, Gil altissonou com uma veemência daquelas que tornam a sentença uma evidência inclemente.
“Faz parte do ethos e do pathos”, acrescentou, e aí eu me lembrei que, em cena anterior do filme, Macalé fala dos patos (sem agá), dizendo que, certa vez, as aves, ao ouvi-lo cantarolar à beira de um lago, responderam aos volteios de seu canto cheio de detalhes, repiques, síncopes, repetindo suas inflexões. Pois, segundo Macalé, é da natureza dos patos ouvir música e responder, e eu acredito: isso ocorre com outros pássaros também, quem já cantou na floresta sabe.
O Gil, ao proferir essas verdades elegantes, não tinha qualquer obrigação de atentar para o fato de que, mesmo tendo abandonado ciclicamente sua carreira, Macao, o conjunto da obra, ainda que difícil, para loucos e raros (ao menos por aqui, pois em Paris ele seria visto como um grande cantor histriônico, de uma expressividade singularíssima) constitui um todo caótico e uno, paradoxal, complexo, culto.
Gil não tem qualquer obrigação, tampouco, de atentar para outro fato: o de que, entre não transigir e não fazer concessão alguma (impossível) e fazer o máximo de concessões possíveis, há gradações. E que a evidência de que Macalé fez poucas concessões constitui a formação da figura que ele é, confere-lhe a sua originalidade, a sua qualidade única. Gil não tinha obrigação de dizer isso nem de prestar qualquer homenagem ao cantar demiúrgico e ao violão pós-Baden Powell posto no liquidificador das emoções e do sofrimento e do amor mais intransigentes, e à sua maneira própria de ser pop sem parecer pop.
Num documentário de Andrucha, Gil, citando Andy Warhol, diz que, se ser pop é gostar das coisas, ele é pop no sentido de “gostar de gostar das coisas”; se Gil, então, gosta tanto de tudo, se abraçou tanto o mundo em seu arcabouço tropico-antropofágico, se Gil elogiou tanto o trabalho de Sandy e exaltou tanto Ivete Sangalo, será que custava muito deixar umas migalhas de reconhecimento ao gênio de Macalé, o pato? Não precisava nem dizer, como disse o Zé Celso Martinez Corrêa no filme de Abujamra e João Pimentel, que Macalé é da estatura artística “de uma Maria Callas ou de um Oscar Niemeyer”. A gente sabe que Zé Celso sempre fala através de hipérboles, embora faça um certo sentido, para quem olha o Macalé como um ser múltiplo, um mascarado de Gotham City, um super-homem mautneriano mas abençoado com mil-e-uma técnicas e arquiteturas, compará-lo a Callas e a Niemeyer sem que isso se converta numa equação de equivalência perfeita, ora pô!
Vejo, talvez equivocadamente, se for me corrijam, a fala de Gil como uma justificativa. Um statement que, mesmo inconscientemente, ilude o receptor, induzindo-o a mergulhar numa hiper-relativização que na verdade não relativiza nada e acaba por desaguar no maniqueísmo. O certo é cuidar da carreira, o certo é embarcar numa lógica contínua, o certo é fazer as concessões que a cada ser forem adequadas, e cada ser colherá os benefícios (de agir assim) enquanto os que não rezarem por essa cartilha, os “outros”, colherão a erva daninha do “maldito”, saco de gatos no qual Macalé, junto com tantos outros, foi jogado. Primeiro para se o excluir do “sistema” e, depois, para trazê-lo de volta, sob um selo que iguala e uniformiza, para efeito de venda, todos aqueles que não “cuidaram” de suas carreiras e, mesmo assim, lá no fundo, bem escondidas atrás das barricadas, têm uma puta expressão artística e são grandiosos e insólitos. Gil, meu ídolo, não tinha obrigação de dizer isso, mas a gente não controla as expectativas sobre nossos ídolos e, por isso, fiquei triste, mas vou lá ouvir de novo o violão luminoso de Gil e, depois, ver de novo o Macalé brilhar no cinema.
Não percam.
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